domingo, 16 de maio de 2010

Capitulo Sétimo

“Mas o que realmente importa nela não são suas palavras, e sim a quem estava destinada suas palavras.”

Philippe Lauck


     - Rachel pare agora de mexer em minhas coisas! – disse a empurrando
     - Para de empurra! – gritou ela mordendo minha mão.
     - Ai! – gritei enquanto ela saia correndo – Sua mimada!
     Agachei-me no chão e comecei a arrumar meus papeis. Ao levantá-los – e junto me levantar – ouvi um baixo barulho de algo leve cair, coloquei os papéis em cima de um cômodo comprido de madeira escura do meu quanto e baixei meu olhar e no chão de madeira um cordão delicado e feminino se destacava brilhando onde havia sol.
     “Nossa já faz um bom tempo!” – pensei – “Será que ela ainda pensa em mim?” – franzi o cenho – “Não claro que não!” – Hmpf – resmunguei balançando minha cabeça com um quase sorriso desenhado em meu rosto. Abaixei-me devagar até meus joelhos encostarem-se ao chão, peguei a delicada corrente olhando bem concentrado, balancei novamente a cabeça retirando as lembranças do dia do hospital e o coloquei – praticamente o joguei – dentro de uma caixinha que ganhará de uma ex-namorada. Andei até a cama e gritei:
     - Mããããe! Quando o jantar fica pronto?
     Demorou um tempo, mas tive uma resposta quase muda de tão baixa.
     - O jantar fica pronto da que uns quinze minutos filho!
     - Tá bom! – gritei de volta e então coloquei meus fones de ouvido, aumentei a musica e comecei a cantar sua letra:

     Peguei um caminho até o fim da linha
Onde ninguém jamais foi.
Acabei em um trem quebrado com ninguém que conhecia.
Mas a dor e desejo eram os mesmos
De onde eles morreriam
Agora eu estou perdido e gritando por socorro.

     Relaxe, vá devagar 
Pois não nada que possamos fazer. 
Relaxe, vá devagar 
Ponha a culpa em mim ou em você. 

     É como se eu estivesse assustado. . 
É como se eu estivesse aterrorizado. 
É como se eu estivesse assustado. 
É como se eu estivesse brincando com fogo. 
Assustado. 
É como se eu estivesse aterrorizado. 
Você está assustado? 
Você está brincando com fogo? 

     Relaxe 
Existe uma resposta para estes momentos mais sombrios
É claro que não entendemos 
Mas a última coisa que passa pela minha cabeça 
É abandonar você
Acredito que estamos juntos nessa,
Não grite - existem muitos a caminhos a seguir.” (Relax, take it Easy - Mika)

     Ao cantar esta ultima parte um rápido insight lançou pequenos fleches em minha mente, fazendo novamente com que me lembrasse das cenas do hospital, e uma pequena saudade da leve sensação prazerosa que me ocorreu em tal momento.
     Existe uma resposta para estes momentos mais sombrios”...“É claro que não entendemos” - pensei cantarolando em minha mente – “Mas a última coisa que passa pela minha cabeça”  - cantarolei em pensamentos – É abandonar você! – quase falei. Comecei a perceber que está musica cada vez mais entrava em meus pensamentos tomando conta de meu cérebro com lembranças de Michelle. Passei a mão em meu cabelo varias vezes com finalidade de afastar tais pensamentos, não funcionou.
     Alguém bateu na porta aliviando meus pensamentos perdidos em curiosidade. – Quem é gritei. – mas ninguém respondeu. “Estranho” pensei comigo mesmo.
     - Rachel! Sua mimada! O que quer aqui? – gritei mal-humorado.
      A porta se abriu bem pouquinho e pude perceber a lateral de seu rosto encolhido por trás da porta. E baixinho disse:
     - Mamãe pediu pra eu te avisa que o jantar ta na mesa – terminou a frase e saiu correndo. “Estranho” pensei de novo.

     - Oi mãe – falei pegando meu prato me servindo. – Oi pai.
     - Eai filhão! Fiquei sabendo de mais uma nota alta na prova de física. – sorri. – se continuar assim, logo terá um aumento na mesada!
     - O que houve para resolver estudar? - Melany, minha mãe disse desconfiada.
     - Nada, mas as vezes é bom estudar – sorri.
     - Você está querendo é o carro quando completar dezesseis anos!
     - Bom... – sorri maliciosamente –, tem isso. Mas os estudos são importantes – meu sorriso malicioso agora mudava para um sorriso amarelo. Olhei de soslaio para o lado onde minha mãe estava sentada e vi ela balançando a cabeça de um lado para o outro com cara de você-não-tem-jeito-mesmo. Ri de um modo gostoso.
     Terminamos de jantar, ajudei minha mãe a tirar a louça e subi para meu quarto. Atirei-me na cama e fiquei olhando para a caixinha que ganhara de presente de minha ex-namorada, Kate.
     Kate é loira – seu cabelo era quase branco de tão loiro – tem olhos bem escuros e grandes, sua pele num tom escuramente clara que chama atenção de todos, realmente tive sorte - quase sorte -, de tela como namorada” pensei obscuramente enquanto me deitava pensativo. Fechei os olhos e apoiei minha cabeça em um dos meus grandes travesseiros, coloquei meus braços em minha testa cruzando-os e fiquei lá, acordado, pensando, sonhando acordado, imaginando, inventando. Dormi.

     Acordei com o sol na manha seguinte. Abri meus olhos e gemi de dor ao esticar meus braços que junto comigo adormeceram na noite. Levantei-me da cama num pulo e corri para o banheiro. Tomei aquele banho e então voltei para meu quarto. Já de roupa fui para a cozinha e comi uns bolos enquanto minha casa permanecia adormecida. Voltei para meu quarto. Peguei meu violão e dele fiz sair algumas notas que dançavam tristezas. Não entendia exatamente o motivo das notas soarem tristes em meus ouvidos, me sentia solitário algo em mim faltava. Não me sentia daquele jeito a um tempo, tudo era quase novo. O sentimento, a sensação, o motivo. Qual era o motivo? Perguntava-me inquieto, e os ecos das melodias ecoavam sem resposta.
     Meio dia enfim escutei um barulho, minha mãe. Uma leve batida em minha porta e um agradável som dançava em meio de minha música.
     - Filho, já acordado? Posso entrar?
     - Oi mãe entra. – respondi calmamente enquanto parava de tocar.
     Entrou, fechou a porta e sentou-se ao meu lado na cama.
     - Acordou que horas?
     - Umas dez. Acho... – olhei para o teto.
     - O que tocava? Nunca ouvi esta musica.
     - Não é uma musica. – sorri – Estava só tocando...
     - Ah. – seu rosto parecia decepcionado – Toca mais. – sorriu.
     Balancei a cabeça anunciando um “sim” e voltei a tocar melodias soltas. Como eram comuns esses momentos, e como eu adorava. Simples e gostosos.
     Uns quinze minutos de violão e conversa, num susto uma batida forte na porta nos despertou da viagem.
     - Mamãe! – a porta se abriu delicadamente - To com fome!
     - Entra um minuto Ray! Estamos tocando.
     Em saltos e sorrisos Rachel entrou e se jogou num pufe azul marinho do lado da minha cama “Toca, toca, toca!” cantou. E então continuei de onde tinha parado. Novamente entramos em um transe perdido pelas melodias que saiam do violão. Parei. Ray e Melany olharam para mim desejando mais.
     - Já deu né gente – ri gostoso.
     - O.k. mas depois, ainda hoje, teremos mais! – ordenou com brincadeira mamãe.
     - To com fome!
     Rindo Melany respondeu:
     - Claro calro! Venha, vamos. – E então saíram serenamente. Bom, na verdade Ray estava mais aos pulos cantarolados do que em serenidade.
     O resto da manha e o inicio da tarde foi tudo mais ou menos assim, eu na minha, meus pais nas deles e Ray de vez em quando entrava em meu quarto para me irrita. Coisa que ela não conseguiu e logo desistiu.
     - Phi?
     - Oi, pode entra.
     Ligeiramente a porta se abriu e uma pessoa pequena correu para minha cama e se deitou. Olhei-a franzindo a testa e perguntei:
     - O que você está fazendo aqui?
     - Tava pensando “nu” meu quarto né. Ai eu quis vim aqui para pergunta... – mordeu o lábio e continuou. – Quem é a menina da foto do colar?
     - Hein? – resmunguei colocando com cuidado o violão no chão. – Como você sabe dela?
     - Porque ela parece com a menina bonita que bateu na porta do hospital aquele dia que eu tava mal...
     Nossa como essa menina tem boa memória. CALMA. Quer dizer que ela foi até o quarto da Rachel?
     - Calma, calma, calma! O que ela foi faze no seu quarto?
     - É ela? – sua boca fez formato de um “O”.
     - O que aquela menina foi fazer lá?
     - Nada, ela disse que bateu no quarto errado.
     - Mas... – pensei alto.
     - É ela né? Vocês tão namorando?
     - Não! Obvio que não! Faz mó tempo que eu não falo com ela! E você não tem nada com isso! Sai já daqui! – gritei furioso.
     - Chato! – gritou Ray batendo a mão em minha perna e saindo correndo do quarto chorando.
     “Porque aquela garota me deixa assim? Não tenho nada com ela!” pensava bravo enquanto me levantava. Respirei fundo afim de afastá-la de meus pensamentos – de novo – e então fui para a sala com alguns instrumentos que haviam em meu quarto.
     Lá sentei no sofá de couro branco cruzando as pernas. Apoiei meu violão em minha perna esquerda enquanto jogava na mesinha de centro um tambor bem pequeno e uma gaita. Comecei novamente a tocar notas perdidas para chamar atenção de minha mãe, minha irmã e meu pai. Não demorou muito e todos estavam acomodados no sofá. Ray pegou o pequeno tambor e Melany a gaita. Num ritmo sincronizado, como se tivéssemos ensaiado, uma agradável musica sem rumo saia de cada instrumento. Rachel correu para o coloco de John – meu pai – que pegou suas mãos e começou a batucar no mesmo ritmo que eu e minha mãe. Logo estávamos enfeitiçados pela musica.
     Todos pararam de tocar no mesmo momento, deixando o som de meu querido instrumento voar sozinho pelo espaço vazio da sala. Parei logo depois e os olhei sem entender. Melany e John se entreolharam e então Rachel deixou seu tamborzinho cair quebrando o silencio. Sorriu e falou:
     - Canta de novo! Vai, vai canta!
     Algo estava errado. Eu não havia cantado. Bom só em minha mente. Será que eu não percebi? Não. Claro que não!
     - Cantar o que? – respondi com medo de mim.
     - Como cantar o que? Você fez esta musica filho? – perguntou-me Melany.
     - Eu não cantei! – parei e olhei para o violão - Cantei?
     - Cantou! – disse meu pai.
     Fiquei pensando comigo um tempo, e então senti meu rosto esquentar, se eles ouviram minha musica então significa que eles escutaram meus sentimentos. SEM MINHA PERMIÇÃO. Quis gritar, mas também não era culpa deles se eu não percebi que cantei alto o que pensava.
     - Vai Phi! Canta, canta! – Ray pulou do colo de meu pai ara o sofá depois do safa para o chão e lá ficou me fitando enquanto pulava animada cantando – bem desafina por sinal – um pedaço da letra de minha musica. – “Enquanto a tristeza vai me dominando eu vou escrevendo e tentando viver. Nada...”
     - O.k. Ray já deu!
     De bico me olhou com raiva e mostrou a língua.
     - A Ray larga de mimo! – de novo um silencio dominou a sala que do nada pareceu escurecer pela tristeza da letra. – Mãe? Pai?
     - Oi? – responderam juntos.
     - Nada. Nada – disse levantando-me. – Boa noite. Vou para meu quarto.
     - Boa noite filho – Disse minha mãe.
     - Boa noite – Rachel e meu pai falaram juntos.

      Cheguei a meu quarto e fiquei pensando sozinho na letra que havia inventado e a quem ela destinava. A letra não era completamente real, digo, ela não é realmente verdadeira. Eu sabia a quem escrevia, mas ao mesmo tempo não sabia. “Estranho” fiquei pensando. Então me levantei, peguei um papel e um lápis, pensei mais algumas vezes na letra entre tanto comecei a escrever a musica:

     Enquanto a tristeza vai me dominando
eu vou escrevendo
e tentando viver.
Nada de errado com alguém,
nenhuma certeza com alguém,
é saudade que tenho
e é isso que me incomoda.

     Gosto de chorar,
isso me faz pensar:
quem é essa pessoa? (quem é?) (quem é ela?)...
Escuto-te a me chamar
nas musicas que ouço,
será que me apaixonei?

     Talvez esteja sentindo calor
ao pensar nesse alguém.
    
     Desejo sentir uma saudade real...
ou pelo menos
minha saudade ter um dono verdadeiro...
que eu saiba quem é.
    
     Pensar em você
sem realmente saber quem é
não é o suficiente para mim...”
     A musica era boa, mas comparado com minhas outras, não passava de algumas letras jogadas em um papel qualquer. Mas o que realmente importa nela não são suas palavras, e sim a quem estão destinada suas palavras. “Michelle?” pensei na pergunta que eu já sabia que era a resposta. Mas não queria aceitar, não iria deixar que uma menina que mora em Vitoria mudar meus sentimentos presentes. “Ela está longe!” pensava para tentar esquecê-la “Eu moro longe dela!” pensei negativo novamente “Qual vai ser a próxima vez que a haverei?” No próximo aniversario de meu bisavô? Quando ele completar 101 anos?”pensei irônico.
     Joguei-me por debaixo das cobertas e relaxei até adormecer.

     - Ops! Desculpa não te vi – disse uma menina ao esbarrar em mim – Deixe-me que o ajude.
     - Não, tudo bem. – disse enquanto me abaixava junto a ela para pegar as folhas com minhas musicas. Nossas mãos se tocaram e por um centésimo de segundo o tempo pareceu congelar, todo parou e então pude observar o rosto da menina que trombara em mim: cabelos compridos e ondulados em um tom de preto bem escuro, olhos levemente verdes e grandes, maquiagem degrade bege a marrom, nariz fino e levemente arrebitado dando-a um charme, e por final, sua boca, carnuda e convidativa. Segurei-me para não tocá-la com as pontas de meus dedos. Acordei de minha viagem ao sentir seus olhos nos meus.
     - Você quem fez? – perguntou ela baixando os olhos e lendo um pequeno trecho de uma das minhas musicas.
     - Sim, fui eu – sorri enquanto nos levantávamos.
     - Nossa... – disse seria – realmente muito bom. Meio triste.
     - São, meus poemas, minhas musicas costumam ser tristes...
     - Bom, não vou mais te atrasar – sorriu me entregou as folhas e saiu sem mesmo dizer seu nome. Olhei para trás e fitei seu caminho, sua leve e curta saia rosa a voar livremente para os lados mostrando-me suas perfeitas coxas. De repente uma musica agitada invadiu minha mente e num pulo acordei.
      - Ahn? – corri para a cômoda de madeira que havia perto da minha cama e peguei o colar que Michelle havia me dado.
      - Cabelos compridos em tom de preto bem escuro! Olhos verdes! Eu sonhei com ela? – falei quase gritando – Como assim? Nem a conheço! – realmente não queria aceitar o fato de que aquela menina era linda, convidativa e que talvez eu realmente estivesse gostando dela. Depois de tanto tempo sem pensar nela, depois de esquecer o colar.
     Voltei para minha cama e apertei o “silenciar” no meu celular para que parasse te tocar. Troquei de roupa e fui para a cozinha. Tomei meu café da manha, acordei Rachel e levei um leite com bolachas para seu quarto. Acordei minha mãe e fui para a sala com meu Ipod escutar algumas musicas enquanto esperava que Melany e Rachel ficassem prontas para irmos ao colégio. 

Capitulo Sexto

Capitulo Sexto

“A música seguiu. O piano em um leve soar e o violino o segue... formando belas cores pautadas no ar.”



     Algumas semanas se passaram, e tudo continuou mais ou menos igual. Minha irmã tendo sonhos estranhos e de vez em quando grita a noite. Meu pai fechado e emburrado em seu novo mundo de tristezas, e eu triste chorando todos os dias em meu quarto. São raros os momentos que em Philippe penso, mas quando penso, fico perdida em um mundo totalmente diferente e feliz.
     Parece que a cada dia que passa tudo que eu senti e sinto por ele, vai diminuindo, parece que some às vezes, mas quando nesses transes entro, a impressão que tenho é de um fogo - é como se eu visse este fogo -, sinto ele dentro de mim, a sensação é estranhamente deliciosa em meus lábios. Mas quando eu acordo... “puf” some!
    Fui ao colégio e no começo algumas pessoas perguntavam o motivo de tanta tristeza, para algumas falava a verdade para outras dizia apenas problemas familiares. Allan e Emma me ajudaram muito a superar, mas mesmo assim quando penso nela meus olhos automaticamente se inundam de água salgada que escorrem contornando meu nariz perfeito até meus lábios encontrarem.
    Quem mudou muito depois dos últimos acontecimentos foi minha irmã. Antes era super largada, preguiçosa, essas coisas... hoje percebo que está mais estudiosa, mais centrada. Comentou em um jantar que gostaria de fazer faculdade fora, ou um intercambio. Foi uma idéia que animou meu pai, fiquei muito feliz ao ver seu primeiro sorriso depois da morte de minha mãe.

     - Mich? Miiiiiich!
     - Ai que susto Emma!
     - A culpa não é minha que você fica dormindo a cordada! – sorriu.
     - Estava apenas pensando!
     - “Viajando em sonhos perdidos, flutuando entre as nuvens fofas do céu, a procura de uma resposta para suas perguntas ‘inrrespondiveis’. De olhos abertos e pupila pequena por causa do sol você dorme profundamente como se estivesse numa morte serelepe.”
     - QUE? – arregalei os olhos e afinei a voz.
     - To brincando! Mas é provável que você diria algo assim para alguém que estivesse dormindo acordada como você!
     Sorri e ri com a idéia de Emma. Depois pisquei demoradamente e balancei a cabeça.
     - Depende da pessoa... – esperei um curto tempo e ela deitou – quase deitou – sua cabeça em seu ombro demonstrando duvida, sorri novamente e continuei. – Por exemplo. Se fosse você eu não diria nada, faria simplesmente isso – levantei minha mão e dei um tapão em sua testa. – E obvio que gritaria: HELLOOO!
     Com os olhos semi cerrados Emma me olhou cheia de ódio e gritou: CORRE! Do que já era para se esperar comecei a rir e correr feito duas baratas tontas no meio do pátio do colégio. No fim ela conseguiu me pegar e eu levei um tapão na testa.
     - Já te disse que você é muuuuito chata?
     - É provável – sorriu ela.
     Entramos na sala quando o sinal tocou e o professor de filosofia entrou mando para que nos sentassem em nossas carteiras.
     - Turma trouxe um texto do Charles Chaplin para vocês! Quero que leiam e discuta com sua dupla sobre o texto para depois escreverem uma redação. Ou se preferirem fazer sozinhos... – não completou a frase como era de seu costume, nos olhou ameaçadoramente e voltou-se para sua mesa. Lá pegou um plástico com vários papeis e distribuiu para nós.
     - Mas escrever sobre o que? – perguntou Julia para o professor.
     - Esse texto é apenas uma base, um assunto, um tema, não precisa ter nada do tipo “eu concordo com o texto porque...” Você decide sobre o que exatamente quer escrever, tendo base no texto do Charles. – ele diz Charles como se fossem amigos á anos, ri ao pensar isso.
     - Obrigada – abaixou a mão e aproximou o texto para perto de seu busto mais desenvolvido para sua idade
     Emma e eu reviramos os olhos com um meio sorriso ao ouvir uma batida leve na porta. “Allan” falamos sem som uma para a outra.
     - Professor! Desculpa chegar atrasado! – era Allan falando da porta da classe – Posso entrar? – a classe riu com a sua cara de beicinho.
     - Pode, pode – disse o professor franzindo a testa – sente-se com Júlia ela te explica a atividade.
     - O.k. – saiu da porta deu uma piscadinha para mim, fazendo-me rir, e foi aos saltos para sua carteira.
     - Vem pegar a folha do exercício. – disse o professor enquanto novamente pegava uma folha da pasta de plástico. – Bom, turma, gostaria agora que vocês dessem uma lida no texto para começarem. Bom trabalho!
     Fiz o que ele pediu li o texto meio falando baixinho - "A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina. Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás pra frente. Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso. Daí viver num asilo, até ser chutado pra fora de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante pra poder aproveitar sua aposentadoria. Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara pra faculdade. Você vai pro colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta pro útero da mãe, passa seus últimos nove meses de vida flutuando... E termina tudo com um ótimo orgasmo!!! Não seria perfeito?”.
     “O que escrever sobre a vida em relação a este texto?” pensava enquanto observava algumas pessoas se juntarem em duplas. “Eu concordo com o texto?” me perguntava. “Sim e não” respondia muda. “Porque sim?... Porque não?” passei dez longos minutos me perguntando e respondendo as perguntas até que achei que estava preparada para escrever. O texto tinha que ter mais de quinze linhas. Comecei:

“Filosofia da vida, da morte

     Existe realmente a morte? Ou será que é apenas um nome em vão que damos a alguém que se vai espiritualmente?
      Em sua nova cama acolchoada os microorganismos devoram sua carne, faz com que se decomponha quieto como o tempo, como se permitisse isso. E isso é uma coisa completamente normal. Mas na morte – na verdadeira morte – o que nos mantém vivo não é nosso corpo, nosso sangue ou nossa carne. É nossa alma, que, aliás, é eterna. Nela o verdadeiro gosto da vida – quer dizer da morte - é o prazer e a solidão. Não escolhemos como queremos nascer, isso simplesmente acontece. Não escolhemos nossa hora de morrer, isso simplesmente o corre. Já deu nosso tempo aqui. Não temos mais o que fazer.
     Quando alguém morre todos choram, todos sentem pena: Ó porque tão cedo? Tadinha Dela, da família. Quando a pessoa morre as pessoas deveriam ficar felizes! A pessoa, além de “ter passado desta para melhor”, já não tinha o que fazer neste mundo infeliz. Mas é inevitável que tal noticia não abale o peito.”

     Um leve soluço escapou de minha boca e todos olharam para mim, fingi não perceber os outros e ignorar as lagrimas que molhavam meu rosto e continuei:

     “É inevitável não chorar pela perda de alguém. É inevitável viver sabendo que tal pessoa não esta mais ‘viva’ entre nós. É inevitável soluçar na hora em que se lembra desse alguém. É completamente inútil chorar por esse alguém. Ele nunca voltará. Não igual”
    

“Michelle Weber.”

    - Professor, acabei. – Gritei na sala de aula.
     - Já?... – perguntou coçando o queixo – Hmmm, bem o traga para mim - peguei meu texto enquanto secava minhas lagrimas, levantei e fui até sua mesa. Lá esperei em pé sua correção, ao terminar de ler ele olhou para mim com um rosto de duvida e então disse num tom de voz estranho. – Porque você nunca escreveu assim?
     - Não sei. – respondi enquanto meus olhos se enchiam de água – posso ir ao banheiro?
     - Sim, claro.
     E então fui ao banheiro e derramei lagrimas. Lagrimas sem sentido se comparar com meu texto. E isso era o que mais doía. De repente tudo ficou preto, mas eu sentia que estava acordada, com medo me abaixei e segurei meus joelhos. Fechei com força meus olhos e ao abri-los nada conseguia ver. Tudo preto e uma leve brisa, e uma vontade súbita de gritar atingiu-me a garganta, mas nada saiu. Esperei um pouco de olhos fechados até escutar uma voz me chamar.
     - Quem é? – perguntei
     - Não reconhece sua melhor amiga? – a voz de Emma mostrava rejeição.
     - Emma! Me ajuda – chorei.
     - O que ouve? – fechei os olhos ao sentir sua mão em mim.
     - Não enxergo! – chorei mais alto
     - Hã? Como assim? Calma, você deve estar confusa, abra seus olhos. Eles estão fechados. Por isso não enxerga – tentava me tranqüilizar.
     Com medo obedeci. De imediato nada vi, mas ao esperar alguns segundos a visão voltou, toda borrada pelas lagrimas.
     - O que aconteceu?
     - Eu não sei!
     - Calma Mich. Foi só um sintoma de desmaio. As pessoas costumam ficar “cegas” antes de desmaiar. Eu acho...
     Nada falei, apenas assenti com a cabeça e voltei para a classe sem falar nada.

     - Filha – disse meu pai a me ver entrar em casa.
     - O que faz tão cedo aqui?
     - Fui dispensado mais cedo. Tenho uma reunião hoje á noite.
     - Ah! Legal. Boa sorte – sorri falsamente.
     - Aconteceu alguma coisa?
     - Sim, mas não quero falar sobre isso...
     - Tudo bem, se mudar de idéia coisa pode falar comigo – me deu um abraço.
     Subi rápidas as escadas e joguei minha mochila em cima da minha cama corri para meu banheiro e tomei um banho. Terminado desci para a coisinha e almocei bem devagar.
     Quatro da tarde. Pulei de susto ao ver a porta da sala ser aberta agressivamente pela minha irmã. Nem olhou para mim, correu para seu quarto batendo pé e porta por onde passava. Nada falei, apenas a encarei assustada. “Ela vai levar uma baita bronca por todo esse escândalo” pensei. Desliguei a televisão, fui novamente até a coisinha e peguei um pedaço de chocolate, devorei-o me deliciando com seu leve gosto amargo. E então subi para meu quarto.
     Entrei e dei apenas um passo para dentro do quarto, fechei a porta com cuidado, contei dez passos dês dá porta até perto da cama e me joguei de onde estava. Já na cama fechei os olhos e cruzei meus braços em cima da cabeça. Comecei a pensar na vida em geral, não tinha muito que fazer então resolvi ir dormir. Peguei meu CD do Secret Garden selecionei a música Adagio para tocar e então relaxei deitada de olhos abertos. Uma boa sensação passou-me a cabeça, e logo me arrepiei pela musica que seguia. “Mamãe” pensei.
     A música seguiu. O piano em um leve soar e o violino o segue, conversando com a orquestra que com o decorrer da música se junta formando belas cores pautadas no ar. Meus pensamentos ficaram perdidos entre o amor e a tristeza que a musica me lembra. Pisquei com força e algumas lagrimas escorregaram de meus úmido olhos. Ao abri-los só enxerguei borrões e mais borrões, fechei-os novamente. A musica parou, um leve silencio encontrou meu quarto até que a segunda música começasse The Promise. No mesmo instante que o primeiro toque do piano soou pelo meu quarto abrir meus olhos fazendo com que mais lagrimas salgadas molhassem minha face. Ao encontro de uma das lagrimas em minha boca uma lembrança expandiu minha mente e então falei baixinho o que minha mãe me prometera há um tempo:
     - Eu serei eterna!

Capitulo Quinto

“Fechei os olhos e só ousei abri-los novamente quando o sol já havia deixado a vista do meu céu.”


     Resolvi então sair da li, levantei levando meu celular comigo e fui para o pátio de meu colégio. Sentei-me em um banco branco de madeira e só quando parei percebi que minha visão estava embaçada por causa das lagrimas que molhavam excessivamente meus olhos. Pisquei forte e uma lagrima molhou minha calça.
     Peguei meu celular e pensei preto. Vazio. Não sabia o que queria, só sabia que eu queria alguma coisa. Talvez minha mãe, talvez Philippe, ou talvez entender. Entender o que? Porque todo mundo estava me olhando daquele jeito!? Abri meu celular e mandei uma mensagem para Emma:

“Emma! Vem pro pátio? URGENTE! Preciso d voc!”

     Não demoro um minuto a vi chegando com a maior cara de preocupação. Perguntei-me porque chegou tão rápido.
     - Mich! O que houve com você na sala?
     - Não sei! – disse choramingando enquanto Emma se aproximava de mim sentando no banco – Comecei a escutar uma musica e de repente umas imagens em fleches começaram a encher minha mente e...
     - Não quero dar uma de amiga nerd chata, mas Mich você tem noção da altura que gritou na sala?
     - Eu gritei? – ótimo! Primeiro perco minha mãe, segundo me apaixono por um menino que nunca mais verei e só para me deixar pior uma terceira coisa tinha que acontecer. Agora vou fica loca? Vi-me dando um sorriso irônico choramingante em minha mente.
     - Grito... você não lembra...? – olhei para ela com os olhos ainda embasados e ela me lançou um olhar do tipo tudo-bem-não-precisa-responder.
     - O que eu gritei? – disse por fim. 
     - Nãaaao! Ahh! – gritou ela tentando me imitar.
     - Não faz tanto sentido assim!
     - O que você viu? – franziu o cenho.
     - Era tudo preto e branco e congelado. Digo: nada se mexia nos fleshes. Tinha uma maca na qual minha mãe estava deitada e meu pai jogado no chão sentado chorando, mas havia algo mais que eu não consegui entender, algo estranho e que me deixou com medo. – franzi o cenho – Ai, do nada senti alguém segurando minha mão – disse fechando-a fortemente – mas não havia ninguém e eu sabia disso – olhei para o chão. – Sentia que era o vento... Mas alguma coisa parecia tão real que me confundi apensar que o menino loiro da foto sabe? – ela fez que sim com a cabeça – Estava segurando minha mão...
    - Calma. Calma. CALMA – falou ela balançando a cabeça. – O que tem uma coisa haver com a outra?
     - Eu o conheci no hospital.
     - E a musica...?
     - É uma musica que me lembra mamãe, ela que me apresentou e eu estava ouvindo quando conheci Philippe!
     - Sinceramente não sei o que posso falar para que se sinta melhor. Nunca fui boa em dar conselhos e essas coisas – concordei fazendo-a sorrir de leve. – Mas você sabe que pode falar o que quiser para mim, me contar tudo, chorar tudo que quiser...
     - Sim, eu sei... obrigada. – já estava me sentindo melhor – Mas só uma perguntinha... Como chegou tão rápido aqui? Eu mandei uma mensagem para você e em dois segundos você chegou...
     - Mandou é? – não respondi, sabia que era uma pergunta retórica – É que meu celular ficou lá em cima, quando você gritou e saiu correndo eu ia te seguir, mas sabia que ia levar a maior bronca da professora... Por isso eu meio que “demorei” para chegar, fui pedir permissão para ela.
     - Ah!... Entendi! Bom, Emma é melhor que suba para terminar seu texto. Você precisa de um ponto na média de História – sorri com a piadinha, e ela também.
     - É isso é verdade. Mas só subo se me garantir que está bem...!
     - Estou quase ótima – menti.
     Emma percebeu, mas entendeu que eu precisava ficar sozinha então subiu – isso é uma das coisas que eu mais gosto nela... que a diferencia das outras pessoas. Ela sabe quando agente nega algo, mas é apenas por educação, o que a faz insistir até que aceitemos. Mas ela também sabe quando agente nega alguma coisa e é verdade, ai ela sai de uma maneira educada. A mesma coisa quando agente aceita.
     Passei o resto da aula no pátio do colégio pensando em nada e chorando de fininho. Enfim o sinal tocou e em cinco segundo ou menos já se ouvia os alunos e alunas conversando alto e andando – alguns correndo – para as escadas.
     - Mich! – ouvi alguém chamar.
     - Mich precisamos conversar! – outra voz se destacou no meio de todo o falatório da hora do intervalo.
     Ah!, oi meninas – disse forçando um sorriso.
     - Então... deixe falar – Jú  parou ao perceber meu sorriso falso e então sua animação a acompanho. – É... bem, fale-me você! O que aconteceu na sala? O que houve que você faltou esses dias...?
     Eu a interrompi fazendo um sinal com de “pare” com a mão e então disse de olhos fechados e bem calma.
     - Jú, minha mãe morreu! – Abri os olhos ao terminar a frase e vi seu rosto chocado. Suas mãos caíram ao lado de seu corpo e então ela levantou um dedo fracassando, depois sorriu – de uma maneira muito irritante – ironicamente, enquanto tentava dizer algo do tipo “a... pare!” e “você está brincando!” fiz que não com a cabeça e seu sorriso irônico – e irritante - e nervoso desmanchou-lhe o rosto.
     - Mi! Você deve estar péssima! Como será perder...
     - Jú você não está ajudando assim – por minha sorte Emma a interrompeu antes de terminar a frase.
     - Tudo bem Emma – tentei ser educada.
     Ficamos um curto tempo em um silencio quase perturbador, então vi Allan chegar perto de nós com sua cara curiosa fixada no rosto surpreso de Jú. Ele apressou o passo e chegou até nós.
     - Me contem tudo! – disse ele com um quase sorriso, e preocupado.
     - Ai meninas o que houve? – continuou ele chocado. (Às vezes acho que ele é meio gay! Que menino se interessa numa fofoca deste jeito?)
     - Allan sabe o que eu disse que precisava falar com você? – não deixei que respondesse – Então... o que aconteceu é que minha mãe... – olhei para minhas mãos, elas estavam fechadas com força. – Ela e... ela morreu à uns dias e...
     - AH. NÃO. MICH! – disse ele enfatizando cada palavra – Não acredito! Elizabeth era tão legal! Como? Quando? P... – ele não continuou então aquele silêncio perturbador novamente nos cercou.
     Fechei meus olhos com força para não chorar e então senti algo me apertar calorosamente forte – algo quente e acolhedor. Senti como se tivesse novamente com minha mãe.
     - Mich, não fique mal com isso... quer dizer, é uma coisa que não se pode evitar e tão obvia que as pessoas não deveriam se abalar tanto assim, mas eu entendo o que você está passando!
     - Tudo bem, não estou mal – menti sorrindo -, só sinto falta dela. Bom... – limpei as lagrimas que ameaçavam cair – enfim, vamos mudar de assunto? – terminei a frase olhando para Emma que entendeu claramente o motivo.
     Levantei-me e sorri dando meus braços para as meninas enquanto Allan dava um breve “Até logo!” e saiu correndo.
     Andamos até a cantina e compramos um sanduíche natural para cada. Fomos nos sentar em um dos banquinhos brancos que havia perto da quadra. Então vi Benjamin, que estava jogando bola na aula de Educação Física. Sorri maliciosamente para Jú e disse:
     - Então... temos uma menina apaixonada no grupo? – olhei para ela e a vi corar.
     - É bem... pode ser – Julia engasgou ao responder.
     - SIM ou Não? – gritou Emma enfatizando mais o “sim” do que o “não”
     - Conta tudo! – disse apressada.
     - Tá bom! – Sorriu ela mostrando-nos seus deslumbrantes dentes brancos que combinavam com sua pele levemente escura e seus cabelos lisos escorridos castanhos.
     Então Jú nos contou tudo sobre seu encontro; que eles ficaram, e que ela nunca tinha sentido algo tão... - “tão, tão... não sei explicar” palavras dela – o sinal tocou nos dando um susto, nos levantamos e quando estávamos a uns dez metros de distancia da quadra ouvimos um menino gritar:
     - Jú! Me espera! – Olhamos para trás e vimos Benjamim correndo em direção a ela. Ao voltarmos o olhar a Jú vimos seu sorriso “incomparador”.
     - Vai lá – disse empurrando-a depois de piscar maliciosamente.
    
     A aula de espanhol já tinha começado quando o professor me chamou até sua mesa – adivinhem para que? Isso! Para me deixar mais mal... -, não disse nada apenas balancei a cabeça assentindo nos momentos certos e depois voltei para minha carteira. Sentei e apoiei meus braços na mesa, não demorou muito tempo para eu me sentir mal e deitar minha cabeça
     - Aiii! – gemi um pouco forçado ao sentir algo leve me acertar com força. Um papel... – do fichário de Emma, para ser mais específica! – A olhei e vi seus olhos transbordando pena, aliás, ela sabe o que é perder alguém muito importante. Peguei o papel do chão e o abri:

     Mi, vc sab que nao precisa ficar! Ficar no colégio assim nao é muito bom pra vc...  nem pra ninguém!

     A olhei e fiquei pensando “ir ou não ir?” depois imaginei eu novamente tendo de novo aquelas visões, gritando do nada sem sequer perceber, e preocupando a todos sem motivo. Resolvi então que Emma estava certa, ela sabia o que era melhor para mim neste momento. Ela já perdeu a mãe e o irmão quando era menor, e pelo que ela nos contou não foi de uma maneira “civilizada”, o irmão que na época tinha dezessete anos morreu esfaqueado por uns adolescentes que ele devia dinheiro, e a mãe três dias depois se suicidou.

       É Em... é melhor que eu va mesmo. Nao to me sentindo muito bem. Obrigada! =/¹

     Joguei em Em – literalmente, mas sem querer – o papel e peguei minha mochila jogando dentro dela meu estojo me levantei e fui até o professor, expliquei para ele que estava mal e que iria para casa, ele assentiu, mas pediu para que eu falasse com a diretora. Foi o que fiz. Ao sair passei na sala dela, ela ligou para meu pai que não atendeu, mas eu a garanti que iria voltar para casa, ela deixou após uma pequena insistência. Peguei um ônibus e voltei.
     Tirei a mochila e procurei a chave, a achei e abri a porta. Quando coloquei meus pés no chão frio - que antes minha mãe costumava varrer comigo escutando musica e brincando que estávamos em um baile dançando “a dança da vassoura” - logo imaginei minha mãe com “cara-de-interrogação” me olhando, eu como resposta disso – se realmente tivesse acontecendo – iria sorrir e lhe explicar o que havia acontecendo, mas não! Lá não estava minha mãe, ali havia apenas sombras de lembranças e de saudades! Que ficariam lá para sempre!
      Novamente minha visão começou a embaçar, minhas pernas a tremerem, suspirei profundo lentamente. Dei outro passo e me virei para fechar a porta, fui até a cozinha peguei uma maçã que estava na fruteira que minha mãe ganhara de aniversário. Enquanto mordia ela e andava até as escadas mandei uma mensagem para meu pai dizendo que estava em casa.
     Cheguei ao meu quarto, fechei a porta e andei – na verdade me arraste – até minha cama, tirei meus tênis e subi nela para fechar as cortinas. Deitei virada pêra meu criado-mudo, nele havia duas fotos, uma de mamãe, e a outra era a que Philippe me dera no hospital. Ascendi à luz de uma pequena lanterna que havia ao lado das fotos, e peguei a foto de Philippe, centrei a luz em seu rosto, fechei os olhos com força tentando não chorar e sonhei acordada por um breve tempo, “só nós dois – não precisa ter, mas nada (fortaleci este pensamento) – sentados apoiados num murinho conversando apaixonadamente. Abri meus olhos. “Será que ele pensa assim também?” perguntei para mim mesma. Resolvi então que eu devia dormir. Esperar deitada na cama com aquele pensamento não ia adiantar em nada – dormir também não, mas pelo menos não perceberia o tempo passar.

     Acordei eram seis horas, com fome desci as escadas até a cozinha, peguei um pão e fiz pão na chapa, como costumava fazer Elisabeth.
     - Filha? – ouvi meu pai gritar meio baixo ao abrir a porta de casa. Dei um pulo.
     - Ai pai, que susto! – virei de volta para terminar de comer meu pão.
     - O que houve para você voltar para casa?
     - É... exatamente isso – não precisava dizer mais nada, dava para saber que ele sabia do que estava falando.
     - É... hmmm.. quer ajuda?
     - Não, obrigada, já terminei... que horas a gente vai jantar?
     - Não sei... Aliás, Mi, você sabe onde sua irmã está?
     - Não está no quarto dela?
     - Dormindo ainda? Não acredito! Que horas que ela voltou com Lucas?
     - Calma pai, lembra que ela saiu com ele ontem já eram umas dez horas! – era isso? – Vai ao quarto dela ver se ela está lá, eu dormi a tarde inteira, ela pode ter se levantado e agente não ter percebido.
     - Tudo bem.
     Ele se foi subindo as escadas, mas sua presença ainda permanecera por suas palavras gritadas do andar de cima.
     - Nicoli! Levante-se já! – um silencio curto agarrou a casa – Niiiiicoli Weber!
     Esperei um tempo então resolvi fingir que não estava escutando, andei de vagar ignorando os gritos de meu pai com minha irmã “rebelde” e liguei a televisão, mudei de canal rapidamente, nada de bom estava passando, então mudei para minha ultima esperança – canal de filmes – e estava passando Ps: Eu te amo, fiquei pensando se veria ou não, quando meu pai desceu furioso e saiu de casa. Dei um pause na televisão e subi rápido para o quarto de minha irmã, ela chorava baixo, e dizia algumas coisas ininteligíveis.
     - O que houve Nick?
     - O que houve? – ela deu uma risada irônica – Olhe para isso! – tirou a mão debaixo das cobertas e quase a lançou em mim. – Olhe!
     Em sua mão haviam vários cortes avermelhados costurados com um tipo de linha preta, percebia minha boca formar um “O”, mas me contive, não por muito tempo, pois quando ela tirou sua perna operada de debaixo das cobertas o que me falto foi apenas gritar.
      - O, que, a-con-te-ceu? – sibilei cada palavra automaticamente.
     Ela ainda chorava – agora mais – e falou entre soluços.
     - Fomos assaltados ontem...
     - Na-na-na-na-naão me diga que vocês foram para... - a interrompi.
     - É, pois é. – Ni esperou um pouco e então continuou não tendo sucesso para segurar suas lagrimas - A noite estava linda agente queria ir para a praia, cheguei muito tarde! Então lá tinham uns marginais que nos viram, então vieram nos pedir dinheiro, só que nós estávamos apenas com os documentos e ele com o celular. – novamente parou, suspirou profundo e lentamente e cuspiu as palavras em cima de mim – Como não tínhamos nada para lhe oferecer – a não ser o celular de Lucas – eles vieram com umas facas para cima de nós, protegi meu rosto e olha! – gritou ela. – Olha minha mão!
     Simplesmente não tive reação e um leve sorriso de nervoso apareceu indesejavelmente em minha face.
     - E-e... – gaguejei -, c-como que vo-v-você está toda costurada?
     - Lucas não teve ferimentos muito graves, ele me pegou no colo e me levou para o carro, pegou meu celular e ligou para um amigo que nos encontrou no hospital e...
     - Ok. Já entendi! Mas o que você quis dizer com “ferimentos graves”? Quer dizer que você tem ferimentos graves?
     - Não! – agora ela já havia parado de chorar – Mas... Ah!, você entendeu o que eu quis dizer!
     - Que susto! E para onde o papai está indo?
     - Disse que ia para casa de Lucas, por isso que estou chorando.
     - Ah... quer ligar lá não é?
     - Sim! Por favor, passa o telefone sem fio e vaza do quarto!
     Olhei-a revirando os olhos e sai do quarto jogando o sem fio em sua cama. Fechei a porta e desci correndo para a sala, peguei uma maçã na cozinha e depois subi para meu quarto. Enquanto comia, lia. Acabei o primeiro livro da coleção Crepúsculo e então como já tinha toda a coleção comecei o segundo Lua Nova ao chegar no terceiro capitulo percebi que chorar um pouco – como ele pode fazer uma coisa dessas com ela? – perguntava para mim, enquanto passava de capitulo em capitulo até meu relógio marcar dez horas.
     - Opa! Esqueci do filme – falei em voz alta, então abri a porta e corri para a sala, meu pai já havia voltado e estava com a cara mais “amarrada” do mundo.
     - Oi pai, vim pegar um CD.
     - Oi. É... filha, sente aqui um minuto.
     “A não! Só falta ele querer me usar como uma ‘espiã’ para descobrir – como se eu já não soubesse – alguma coisa da minha irmã.” Pensei
     - Sim – disse ao sentar.
     - Queria te pedir uma coisa, é muito importante, e como sei que com sua irmã não vai dar certo... Queria ter total confiança em você... Quero que você sempre me diga para onde vá com seus amigos, para que não cometa o mesmo erro que Nicoli.
     - Pai, tudo bem... eu não vou fazer burra...
     - Apenas prometa – ele me interrompeu.
     - Tudo bem, eu prometo.
     - Ok. Pode ir. Não vá dormir muito tarde!
     - “Podexa” – gritei enquanto subia a escada rumo ao meu quarto, para ver o filme.
     Abri minha porta e corri para a televisão. Coloquei o CD no aparelho de DVD e apertei o play.

     - Ãh? – Acordei tomando um susto. – Que barulho é esse? – tentei abrir meus olhos sem sucesso. “Ah!, droga, hoje é dia de faxina, a moça que trabalha aqui chego... mais tão cedo?” pensei comigo mesma ainda tentando abrir meu olhos. Me virei na cama, ficando de barriga para baixo e com o travesseiro em cima de minha cabeça. Fechei os olhos e só ousei abri-los novamente quando o sol já havia deixado a vista do meu céu. Acordei ótima, como se tivesse nascido de novo – ou como se minha mãe ainda estivesse viva – me levantei rápido e fui logo tomar eu café da manha – ou melhor, dizendo meu lanche da tarde – uma banana amassada com aveia. Foi quando escutei um leve gemido vindo de algum lugar de cima. Nicoli!
     Subi correndo as escadas abri a porta de seu quarto e lá estava ela, rolando de um lado para o outro com todas as luzes apagadas gemendo – quase gritando – de dor. Mas com o que? Percebi que seus olhos estavam fechados, relaxei
     - Nicoli! – gritei baixo enquanto segurava seus ombros – Nicoli! – falei um pouco mais alto. – ACORDE! – gritei, e no mesmo instante seus olhos abriram assustados e vermelhos.
     - Que? Porque me acordou? – brigou ela.
     - Porque você mais gemia e gritava do que dormia – peguei um espelho que havia do lado de sua escrivaninha -, olhe!
     - Ah! Que isso? Sou e-eu? Meus olhos! – já imaginava essa reação dela, - só que pensei que seria mais exagerada –, menina mimada, de olhos verdes esmeraldas e cabelos negros, quase azuis de tão negros só poderia morrer se algo estranho acontecesse com seu lindo “corpitcho”. – Michelle, o que você fez? Porque eles estão assim? Colírio, colírio! Ai!, parece que eu passei a noite fumando! Não acredito nisso! – ela entrava em desespero e eu me divertia de ver seu rosto quase da cor de seus olhos.
     - Ou! Calma ai! Não fiz nada com você! Estou rindo da cara que você fez! Se você não sabe o motivo de seus olhos estarem vermelhos... – esperei um pouco –, imagina eu!
     - Tá! Meus olhos podem estar vermelhos, mas porque? – ela parou um pouco e pareceu pensar. – Eu sonhei esta noite. Eu sonhei! – Nicoli esperou uma resposta, mas apenas sentei em sua cama e fiz que sim com minha cabeça. – Sonhei com varias coisas... não me lembro bem, mas parece que o seu enamorado estava lá.
     - Ok! Agora isso está ficando pessoal, o que você sonhou com o Philippe? – disse irritada.
     - Não lembro! Só lembro que ele estava lá, ai algumas dores fortes começaram a me agarrar – digamos assim – a perna.
     - Tudo bem, temos uma desculpa pelos gritos. Mas por que os olhos...? – não completei a frase.
     - Só lembro-me de olhar em um espelho bem grande, tipo aqueles de balé sabe? – fiz que sim – Ai você me acordou.
     - Estranho! – Nicoli balançou a cabeça para cima e para baixo e voltou a se deitar. - Bom, enfim... Vou voltar para baixo, qualquer coisa grita... geme, sei lá faz algo para que eu suba.
     - Uhu, ta bem.
     Desci para a cozinha e terminei de comer meu “café da manha”, fui para sala e fiquei assistindo um filme – não me pergunte o nome. Meu pai chegou da rua andando pesadamente pela casa, falou um “oi” ríspido e se foi escada a cima sem me dar chance de responder. Continuei vendo o filme quieta para ver se ele iria dizer algo. Nada disse.

Seguidores