domingo, 16 de maio de 2010

Capitulo Sexto

Capitulo Sexto

“A música seguiu. O piano em um leve soar e o violino o segue... formando belas cores pautadas no ar.”



     Algumas semanas se passaram, e tudo continuou mais ou menos igual. Minha irmã tendo sonhos estranhos e de vez em quando grita a noite. Meu pai fechado e emburrado em seu novo mundo de tristezas, e eu triste chorando todos os dias em meu quarto. São raros os momentos que em Philippe penso, mas quando penso, fico perdida em um mundo totalmente diferente e feliz.
     Parece que a cada dia que passa tudo que eu senti e sinto por ele, vai diminuindo, parece que some às vezes, mas quando nesses transes entro, a impressão que tenho é de um fogo - é como se eu visse este fogo -, sinto ele dentro de mim, a sensação é estranhamente deliciosa em meus lábios. Mas quando eu acordo... “puf” some!
    Fui ao colégio e no começo algumas pessoas perguntavam o motivo de tanta tristeza, para algumas falava a verdade para outras dizia apenas problemas familiares. Allan e Emma me ajudaram muito a superar, mas mesmo assim quando penso nela meus olhos automaticamente se inundam de água salgada que escorrem contornando meu nariz perfeito até meus lábios encontrarem.
    Quem mudou muito depois dos últimos acontecimentos foi minha irmã. Antes era super largada, preguiçosa, essas coisas... hoje percebo que está mais estudiosa, mais centrada. Comentou em um jantar que gostaria de fazer faculdade fora, ou um intercambio. Foi uma idéia que animou meu pai, fiquei muito feliz ao ver seu primeiro sorriso depois da morte de minha mãe.

     - Mich? Miiiiiich!
     - Ai que susto Emma!
     - A culpa não é minha que você fica dormindo a cordada! – sorriu.
     - Estava apenas pensando!
     - “Viajando em sonhos perdidos, flutuando entre as nuvens fofas do céu, a procura de uma resposta para suas perguntas ‘inrrespondiveis’. De olhos abertos e pupila pequena por causa do sol você dorme profundamente como se estivesse numa morte serelepe.”
     - QUE? – arregalei os olhos e afinei a voz.
     - To brincando! Mas é provável que você diria algo assim para alguém que estivesse dormindo acordada como você!
     Sorri e ri com a idéia de Emma. Depois pisquei demoradamente e balancei a cabeça.
     - Depende da pessoa... – esperei um curto tempo e ela deitou – quase deitou – sua cabeça em seu ombro demonstrando duvida, sorri novamente e continuei. – Por exemplo. Se fosse você eu não diria nada, faria simplesmente isso – levantei minha mão e dei um tapão em sua testa. – E obvio que gritaria: HELLOOO!
     Com os olhos semi cerrados Emma me olhou cheia de ódio e gritou: CORRE! Do que já era para se esperar comecei a rir e correr feito duas baratas tontas no meio do pátio do colégio. No fim ela conseguiu me pegar e eu levei um tapão na testa.
     - Já te disse que você é muuuuito chata?
     - É provável – sorriu ela.
     Entramos na sala quando o sinal tocou e o professor de filosofia entrou mando para que nos sentassem em nossas carteiras.
     - Turma trouxe um texto do Charles Chaplin para vocês! Quero que leiam e discuta com sua dupla sobre o texto para depois escreverem uma redação. Ou se preferirem fazer sozinhos... – não completou a frase como era de seu costume, nos olhou ameaçadoramente e voltou-se para sua mesa. Lá pegou um plástico com vários papeis e distribuiu para nós.
     - Mas escrever sobre o que? – perguntou Julia para o professor.
     - Esse texto é apenas uma base, um assunto, um tema, não precisa ter nada do tipo “eu concordo com o texto porque...” Você decide sobre o que exatamente quer escrever, tendo base no texto do Charles. – ele diz Charles como se fossem amigos á anos, ri ao pensar isso.
     - Obrigada – abaixou a mão e aproximou o texto para perto de seu busto mais desenvolvido para sua idade
     Emma e eu reviramos os olhos com um meio sorriso ao ouvir uma batida leve na porta. “Allan” falamos sem som uma para a outra.
     - Professor! Desculpa chegar atrasado! – era Allan falando da porta da classe – Posso entrar? – a classe riu com a sua cara de beicinho.
     - Pode, pode – disse o professor franzindo a testa – sente-se com Júlia ela te explica a atividade.
     - O.k. – saiu da porta deu uma piscadinha para mim, fazendo-me rir, e foi aos saltos para sua carteira.
     - Vem pegar a folha do exercício. – disse o professor enquanto novamente pegava uma folha da pasta de plástico. – Bom, turma, gostaria agora que vocês dessem uma lida no texto para começarem. Bom trabalho!
     Fiz o que ele pediu li o texto meio falando baixinho - "A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina. Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás pra frente. Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso. Daí viver num asilo, até ser chutado pra fora de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante pra poder aproveitar sua aposentadoria. Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara pra faculdade. Você vai pro colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta pro útero da mãe, passa seus últimos nove meses de vida flutuando... E termina tudo com um ótimo orgasmo!!! Não seria perfeito?”.
     “O que escrever sobre a vida em relação a este texto?” pensava enquanto observava algumas pessoas se juntarem em duplas. “Eu concordo com o texto?” me perguntava. “Sim e não” respondia muda. “Porque sim?... Porque não?” passei dez longos minutos me perguntando e respondendo as perguntas até que achei que estava preparada para escrever. O texto tinha que ter mais de quinze linhas. Comecei:

“Filosofia da vida, da morte

     Existe realmente a morte? Ou será que é apenas um nome em vão que damos a alguém que se vai espiritualmente?
      Em sua nova cama acolchoada os microorganismos devoram sua carne, faz com que se decomponha quieto como o tempo, como se permitisse isso. E isso é uma coisa completamente normal. Mas na morte – na verdadeira morte – o que nos mantém vivo não é nosso corpo, nosso sangue ou nossa carne. É nossa alma, que, aliás, é eterna. Nela o verdadeiro gosto da vida – quer dizer da morte - é o prazer e a solidão. Não escolhemos como queremos nascer, isso simplesmente acontece. Não escolhemos nossa hora de morrer, isso simplesmente o corre. Já deu nosso tempo aqui. Não temos mais o que fazer.
     Quando alguém morre todos choram, todos sentem pena: Ó porque tão cedo? Tadinha Dela, da família. Quando a pessoa morre as pessoas deveriam ficar felizes! A pessoa, além de “ter passado desta para melhor”, já não tinha o que fazer neste mundo infeliz. Mas é inevitável que tal noticia não abale o peito.”

     Um leve soluço escapou de minha boca e todos olharam para mim, fingi não perceber os outros e ignorar as lagrimas que molhavam meu rosto e continuei:

     “É inevitável não chorar pela perda de alguém. É inevitável viver sabendo que tal pessoa não esta mais ‘viva’ entre nós. É inevitável soluçar na hora em que se lembra desse alguém. É completamente inútil chorar por esse alguém. Ele nunca voltará. Não igual”
    

“Michelle Weber.”

    - Professor, acabei. – Gritei na sala de aula.
     - Já?... – perguntou coçando o queixo – Hmmm, bem o traga para mim - peguei meu texto enquanto secava minhas lagrimas, levantei e fui até sua mesa. Lá esperei em pé sua correção, ao terminar de ler ele olhou para mim com um rosto de duvida e então disse num tom de voz estranho. – Porque você nunca escreveu assim?
     - Não sei. – respondi enquanto meus olhos se enchiam de água – posso ir ao banheiro?
     - Sim, claro.
     E então fui ao banheiro e derramei lagrimas. Lagrimas sem sentido se comparar com meu texto. E isso era o que mais doía. De repente tudo ficou preto, mas eu sentia que estava acordada, com medo me abaixei e segurei meus joelhos. Fechei com força meus olhos e ao abri-los nada conseguia ver. Tudo preto e uma leve brisa, e uma vontade súbita de gritar atingiu-me a garganta, mas nada saiu. Esperei um pouco de olhos fechados até escutar uma voz me chamar.
     - Quem é? – perguntei
     - Não reconhece sua melhor amiga? – a voz de Emma mostrava rejeição.
     - Emma! Me ajuda – chorei.
     - O que ouve? – fechei os olhos ao sentir sua mão em mim.
     - Não enxergo! – chorei mais alto
     - Hã? Como assim? Calma, você deve estar confusa, abra seus olhos. Eles estão fechados. Por isso não enxerga – tentava me tranqüilizar.
     Com medo obedeci. De imediato nada vi, mas ao esperar alguns segundos a visão voltou, toda borrada pelas lagrimas.
     - O que aconteceu?
     - Eu não sei!
     - Calma Mich. Foi só um sintoma de desmaio. As pessoas costumam ficar “cegas” antes de desmaiar. Eu acho...
     Nada falei, apenas assenti com a cabeça e voltei para a classe sem falar nada.

     - Filha – disse meu pai a me ver entrar em casa.
     - O que faz tão cedo aqui?
     - Fui dispensado mais cedo. Tenho uma reunião hoje á noite.
     - Ah! Legal. Boa sorte – sorri falsamente.
     - Aconteceu alguma coisa?
     - Sim, mas não quero falar sobre isso...
     - Tudo bem, se mudar de idéia coisa pode falar comigo – me deu um abraço.
     Subi rápidas as escadas e joguei minha mochila em cima da minha cama corri para meu banheiro e tomei um banho. Terminado desci para a coisinha e almocei bem devagar.
     Quatro da tarde. Pulei de susto ao ver a porta da sala ser aberta agressivamente pela minha irmã. Nem olhou para mim, correu para seu quarto batendo pé e porta por onde passava. Nada falei, apenas a encarei assustada. “Ela vai levar uma baita bronca por todo esse escândalo” pensei. Desliguei a televisão, fui novamente até a coisinha e peguei um pedaço de chocolate, devorei-o me deliciando com seu leve gosto amargo. E então subi para meu quarto.
     Entrei e dei apenas um passo para dentro do quarto, fechei a porta com cuidado, contei dez passos dês dá porta até perto da cama e me joguei de onde estava. Já na cama fechei os olhos e cruzei meus braços em cima da cabeça. Comecei a pensar na vida em geral, não tinha muito que fazer então resolvi ir dormir. Peguei meu CD do Secret Garden selecionei a música Adagio para tocar e então relaxei deitada de olhos abertos. Uma boa sensação passou-me a cabeça, e logo me arrepiei pela musica que seguia. “Mamãe” pensei.
     A música seguiu. O piano em um leve soar e o violino o segue, conversando com a orquestra que com o decorrer da música se junta formando belas cores pautadas no ar. Meus pensamentos ficaram perdidos entre o amor e a tristeza que a musica me lembra. Pisquei com força e algumas lagrimas escorregaram de meus úmido olhos. Ao abri-los só enxerguei borrões e mais borrões, fechei-os novamente. A musica parou, um leve silencio encontrou meu quarto até que a segunda música começasse The Promise. No mesmo instante que o primeiro toque do piano soou pelo meu quarto abrir meus olhos fazendo com que mais lagrimas salgadas molhassem minha face. Ao encontro de uma das lagrimas em minha boca uma lembrança expandiu minha mente e então falei baixinho o que minha mãe me prometera há um tempo:
     - Eu serei eterna!

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